domingo, 13 de janeiro de 2013

O diário de Helena - Página 12


Gente, eu estou me perguntando até agora o sentido daquela palhaçada do Júlio. Eu já achava ele um completo imbecil, agora então... é claro que esquecer o corpo dele não é tão fácil, mas o caráter e o gênio dele são dignos de uma lata de lixo. Ou ele queria me zoar, ou então eu estou no estilo daquela música “me diz aí menina o que é que você tem? Tem, tem, tem, você tem mel nesse trem!”... deve ser os dois.

O fato é que o saldo está positivo pro meu lado. Digo isso porque podemos colocar no débito meu universitário, meu ex dj muito louco, meu colega, digo, inimigo de trabalho e um doutor que possivelmente me deu mole. Falando nisso, essa manhã, quando fui acordada pela minha mãe me ligando insistentemente, vi uma chamada perdida do meu lindo e gostoso Rodrigo Dualibe. Eu quase quis me jogar pela janela, morreria despencando de seis andares. O fato é que quando fui retornar pra ele, minha campainha tocou. E só o fato dela ter tocado já fez meu dia começar absolutamente complicado. Era a minha mãe.

Chegou aqui em casa que nem uma coroa que não aceita ser velha. Melhor dizendo, vamos abrir o verbo, ela estava piriguete mesmo. Mas não posso negar que ela está uma velha gostosa. Enfim... ela me deu um abraço rápido e apertou o meu nariz (coisa que eu não suporto). Veio com uma bolsa grande e uma mala pequena e já me assustei.

- Filha, vim passar uns dias na praia. Nossa, esse seu apartamento está tão... um apartamento de virgem. O que está acontecendo? Nada de botar a Heleninha pra jogo?

Puta que paril, mãe, puta que paril!

- Botar a Heleninha pra jogo? Mãe, mas que porra você está falando? É o tal do surfista idiota que está te deixando assim? Por que se for – Ela me interrompeu e mudou a fisionomia.

- Não fala assim dele.

Me irritei mais ainda.

- Não falar assim dele? Qual é, mãe? Você acha que ele está contigo pra quê? Pra pegar seu dinheiro, se toca!

- Helena, eu não admito que fale assim comigo, estamos há quase um ano sem se ver e é assim que você me recebe?

Ela sempre gosta de virar o jogo e se fazer de vítima, por mais que isso tenha me irritado completamente, eu respirei e tentei levar a conversa numa boa.

- Tá... tá bom. E cadê ele?

- Ele não veio, insisti muito pra vir, mas está pra fechar uns negócios com o pai lá na empresa deles, enfim, resolvi vir sozinha te ver.

Ainda bem que ela ainda não perdeu o juízo completamente!

- E quanto tempo pretende ficar?

- Hoje e amanhã só, vou embora domingo de manhã, vim de carro.

Ela pegou as coisas e ficou me olhando com uma cara de: ‘seja simpática’.

- Me dá suas coisas, vou levar pro quarto. – Peguei a bolsa e a mala dela, que apesar de pequena, estava um chumbo pra quem ia ficar somente dois dias. Coloquei no quarto que reservo para visitas e voltei para a sala. Ela observava uma foto ampliada do papai, que estava em um quadro numa parede perto da mesa de jantar.

Parei ao lado dela e a olhei. Seu olhar era enigmático.

- Também sente falta dele? – A questionei.

- Sim, seu pai apesar de tudo foi um grande homem.

Apesar de tudo? Como assim?

- O que quis dizer com o “apesar de tudo?”.

Ela continuou olhando para o quadro.

- Ele era uma pessoa muito difícil, geniosa demais, tentávamos não brigar na sua frente, mas quando íamos para o quarto, muitas vezes ao invés de nos amarmos, passávamos um longo tempo batendo boca.

- Não vejo meu pai assim, as lembranças que tenho dele comigo são maravilhosas.

- Pode ser, ele era um ótimo pai, mas não era um homem ótimo.

- Por que está falando isso agora? – Voltei a me irritar.

- Porque estou me lembrando dele.

- Por que então casou com ele e teve uma filha? – Saí de perto dela e sentei no sofá.

- Não sei, Helena, tem certas coisas que a gente faz e não sabe nem o motivo.

Arregalei os olhos um pouco confusa, absorvendo a informação.

- Mas vamos falar de outra coisa, e seus boys, como andam? – Ela desconversou.

Falar de outra coisa?

- Não, agora não vou falar de outra coisa. Você acabou de insinuar que muito possivelmente eu nasci de uma forma altamente inesperada, sem motivo.

Ela andou até mim e parou na minha frente. Cruzou os braços e me encarou.

- Não ou falar disso com você. Vim te ver, quero saber de outras coisas, esquece o que eu disse. Você deve ter entendido errado.

- Entendido errado? Eu posso ser tudo, menos surda e burra. Mas tudo bem, você sempre foge das coisas que fala. É melhor mesmo deixar meu pai pra lá.

Levantei e fui até meu quarto trocar de roupa. Quando estava terminando de vestir minha blusa, virei e vi minha mãe plantada na porta me olhando.

- Vai aonde, Helena?

- Vou dar uma andada na praia, preciso processar bem sua chegada e o que me disse.

- Você tá agindo como criança. Aliás, você sempre foi uma criança mimada, graças ao seu pai.

Fuzilei ela com meus olhos.

- Se você pegou a estrada pra vir falar esse monte de besteiras, por favor, mãe, queira voltar pra sua cidade e pro seu surfista, que deve ser um cara muito mais digno que o seu falecido marido.

Quando passei por ela, ela segurou meu braço forte e me pressionou contra a porta.

- Você está precisando esfriar a cabeça mesmo. Vai dar uma volta, porque quando voltar eu quero conversar sério contigo. Vou aproveitar pra dar um jeito nesse seu apartamento. Já trouxe algum homem aqui?

- Você não vai mexer em nada. E acho que tenho 32 anos e não preciso te dar mais satisfações de determinadas coisas, principalmente com quem eu faço sexo. Até mais.

Peguei o caminho da porta e saí transtornada. Como é que ela pode ser assim? Tudo bem, sei que minhas atitudes foram infantis e que estamos há basicamente um ano sem se ver. Mas essa não é a minha mãe. E eu tenho certeza que tem dedo desse surfista maldito. Se eu encontro com ele, acho que o salto agulha que eu nunca usei vai ser de boa serventia.


...

2 comentários:

  1. Pow, ninguém lê e nem comenta nada aqui né?

    ResponderExcluir
  2. Gostei...Questões de família, sofro com isso direto...Pow, eu brigo com a minha mãe o tempo todo...Não a suporto...Mas é mãe...Não deu para escolhê-la ao nescer....

    Fazer oq?

    @rafaelrisse

    ResponderExcluir